terça-feira, 24 de setembro de 2013

She Will Be Loved - Você gosta de mim?

                Antes de descermos do táxi Justin deu um beijo com bafo de álcool no rosto do motorista, o que o deixou com raiva e o fez pedir que eu saísse dali logo com Justin. Segurei-o firme enquanto fechava a porta do carro e ainda ria com a reação nervosa do homem de cerca de 50 anos.
- Eu posso ir sozinho – disse Justin com a voz embargada, dando um passo à frente e desvencilhando-se do meu braço que o apoiava.
                Justin estendeu os dois braços e andou abruptamente até tropeçar na guia e cair de bunda na calçada. Imaginei que sua intenção era segurar-se no poste ao lado, mas foi na direção contrária. Aproximei-me dele e ofereci minha mão para ajudá-lo a levantar-se, porém ele não a segurou. Apenas olhou para mim e deu dois tapinhas do seu lado. Sentei-me ali e senti a mistura do seu perfume com o cheiro de álcool. Ficamos assim durante um tempo, sem dizer nada, apenas de bobeira. Desejei que ele estivesse sóbrio. Seu olhar estava distante. Eu olhava para frente, às vezes para ele, mas não percebia.
- Trisha, você é tão linda. Eu sinto sua falta. Desculpe ter errado com você. Sei que sou um estúpido. Não consigo esquecer tudo que vivi com você. Se eu pudesse faria tudo de novo e mudaria o final da nossa história. Queria que você estivesse aqui. – Justin disse pausadamente e com a voz arrastada, quebrando o longo silêncio. A cada frase eu ficava mais intrigada, mas quando disse a última, senti meu coração fraquejar. Senti-me horrível por ele estar comigo pensando em outra pessoa. Isso só mostrava o quanto insuficiente eu era. Tudo bem, ele estava bêbado, mas dizem que é quando as pessoas dizem as verdades. E eu sempre acreditei nisso.
                Justin abaixou a cabeça. Ouvir aquilo me fez mal, mas sem dúvida alguma vê-lo naquela situação era imensuráveis vezes pior. E juntando tudo, eu me sentia tão insignificante quanto uma formiga no meio da multidão de humanos. Queria poder fazê-lo feliz, queria que o fizesse esquecer Trisha, independente de quem tenha sido e do que aconteceu com ela. Mas sabia, talvez mais que muita gente, que no nosso coração os lugares de algumas pessoas não podem simplesmente ser ocupados por outras.
- Vamos entrar? Está ficando frio aqui – disse passando as mãos pelos braços, como se aquilo fosse ajudar a me esquentar.
                Levantei-me e quando ia me virar parar ajudar Justin a fazer o mesmo, ele já havia feito. Mais do que isso, estava de frente com o portão de minha casa olhando fixamente para o... chão? Aproximei-me e ele nem se mexeu. Depois começou a rir baixo, e seu riso foi se erguendo até chegar a ser uma gargalhada. Tive vontade de batê-lo por ser tão idiota. Parecia que tinham lhe contado a melhor piada do mundo.
- Isso... – disse fazendo esforço para recuperar o ar – Isso... É um portal! – respirou fundo e parou de rir abruptamente, como se tivesse percebido que a piada não tem graça alguma, e sua expressão ficou séria – Vem, Megan. Você precisa me ajudar a encontrar a passagem secreta, só precisamos descobrir onde fica e consequentemente como abri-la, se trabalharmos juntos não teremos problemas com isso. – disse andando de um lado para o outro, parecendo um nerd paranoico e obcecado procurando a resposta de uma questão. “Então agora você lembra meu nome”, pensei. Justin abaixou-se e se ajoelhou diante do portão, tateando o chão com as duas mãos como se fosse possível um pedaço de concreto sair dali com tal facilidade. – Vamos conseguir chegar em Groenlândia, sei que vamos. E depois disso nunca mais sofreremos, porque em Groenlândia ninguém sofre. Lá poderemos fazer o que quisermos sem medo de nos julgarem. Em Groenlândia a vida é diferente. É o paraíso para qualquer pessoa. Groen... Lândia. Estamos quase lá. Não podemos desistir, não vamos. Os rios são feitos de milk-shake e as folhas das árvores são batatas fritas. É melhor que o País das Maravilhas. Em Groenlândia todos seremos amigos, cantaremos músicas que falam sobre paz enquanto estivermos unidos em um círculo perfeito com as mãos dadas e girando livremente. Quem quiser apenas sussurrar, poderá apenas sussurrar, quem quiser gritar, poderá gritar. Lá seremos finalmente as pessoas dentro de nós que são tão reprimidas pela sociedade nesse mundo injusto. Em Groenlândia não há sociedade. Todos somos livres. Não existem diferenças. Não existe morte. Não existe doença. Não existe dor. Podemos tanto comer algodão doce o dia todo e não pegar diabete, quanto usar drogas o dia todo e não morrer de overdose. Como eu disse... É o paraíso. Precisamos nos salvar, precisamos chegar em Groenlândia. As paredes têm gosto de paçoca e o telhado de doce de abóbora. A primeira coisa que farei quando chegarmos é brincar com as crianças de amarelinha. As crianças... Seres tão adoráveis. Como podem existir pessoas que não gostam delas? São tão inocentes. Espere mais um pouco. Estou chegando lá. Groenlândia... – murmurava alto o suficiente para eu escutar enquanto continuava a parecer um louco que precisa se internar em um hospital psiquiátrico o mais rápido possível em um quarto com segurança reforçada.
                Não sabia se ria ou me preocupava por vê-lo naquela situação deplorável. Dizem que quando bêbadas cada pessoa tem uma reação. Então a dele era essa, ser bipolar, ficar mais idiota do que normalmente é e relembrar coisas do passado?
- Justin – chamei enquanto me abaixava e segurava seus dois pulsos, quando consegui fazer com que ele prestasse atenção em mim continuei – Depois você pode vim continuar procurando o portal, mas não vai querer chegar em Groenlândia cheirando mal, vai? – Imediatamente ele se levantou.
                Entramos em casa e joguei as chaves no sofá. Quando olhei ao meu redor, Justin já não estava mais ali. Fui até meu quarto e ouvi um murmúrio vindo do banheiro. Assim que adentrei ali observei Justin com as duas mãos apoiadas no vidro do box, ele as olhava fixamente enquanto mexia os dedos e sorria. “É, te dar banho vai ser uma coisa difícil”, pensei.
- Você precisa tirar a roupa – disse chamando sua atenção, Justin virou-se para mim e mordeu os lábios, fazendo uma cara de safado – Não é para o que está pensando. Precisa é de um banho.
                Justin deu de ombros e voltou-se para o box transparente, bufei. Fui até ele e comecei a puxar sua camiseta para cima, ele ergueu os braços para facilitar e depois de tirada, deixei-a cair no cesto de roupa suja. Observei por um momento as pintinhas em sua costa e as curvas perfeitas que ela fazia. Justin pigarreou e segurei sua cintura, fazendo-o virar-se de frente para mim. Coloquei as mãos na barra da sua calça e logo a desabotoei e abri seu zíper. Em seguida abaixei-a e Justin terminou tirando os pés. Ele me olhou de cima a baixo e quando me dei conta estava a poucos centímetros do meu rosto. Olhei para seus lábios e estavam perto demais para que eu pudesse resistir. Beijei-o calmamente, suas mãos segurando minha cintura enquanto apertava meu corpo contra o seu e as minhas arranhando levemente sua costa. Mordi seu lábio e pude jurar que ele sorrira. Desfiz o beijo e fiquei sem jeito, petrificada, Justin me olhando sem expressão. Apontei para o chuveiro e ele assentiu. Sai do banheiro e respirei fundo, como se ali estivesse me faltando oxigênio. Fui para cozinha e preparei rapidamente um macarrão com queijo. Quando voltei ao quarto Justin estava sentado na minha cama só de cueca e secando o cabelo com uma toalha branca. Assim que percebeu minha presença parou e me olhou. Mas aquele não era o olhar do Justin bêbado, era o olhar do Justin sóbrio que mesmo sendo implicante eu gostava. Não saberia dizer se o banho o ajudara 100%, mas aparentemente ele estava bem melhor.
- Eu não achei outra, então usei a que tinha no banheiro – disse se referindo à toalha.
- Tudo bem – sorri internamente por saber que ele pensava que eu me importaria com isso. – A comida está pronta. – disse e sai em direção à cozinha, com Justin atrás de mim.
                Devo admitir que, apesar de estar acostumada a vê-lo de cueca, era estranho vê-lo de cueca na minha sala em um momento no qual não pensávamos em transar. Depois de jantarmos, colocamos meu colchão de casal na sala e jogamos sobre ele travesseiros e cobertas. Não fazia frio. Na verdade estávamos com o ventilador do teto rodando no volume máximo e mesmo assim não parecia suficiente. No entanto o costume de dormir enrolada nas cobertas era mais forte que o calor. Colocamos “Invocação do Mal” no aparelho de DVD e nos deitamos. A princípio, mantivemos uma distância um do outro. Mas logo Justin abriu o braço e eu me aconcheguei no seu ombro. Seu cheiro natural invadindo minha narina mais uma vez. Ele parecia realmente totalmente sóbrio, e era bom não tê-lo cheirando álcool. É claro que fui contra a escolha desse filme, implorei que víssemos uma comédia, mas Justin prometeu que na próxima vez eu escolheria e que me protegeria se ficasse com medo. Acreditei nele como uma criança acredita na história da cegonha. Confiar em Justin era algo que de alguma maneira me assustava. Como se eu fosse capaz de realmente crer em Papai Noel se fosse ele a me contar sobre isso. No meio do filme, depois de já ter me encolhido diversas vezes para não olhar a tela da televisão, Justin quebrou o silêncio entre nós.
- Megan – sua voz saiu rouca, e devo dizer que a preferia assim. Apertei sua mão como sinal de que ele poderia continuar – Obrigado. Digo, por ter me escolhido mais cedo. É uma sensação boa. Ser escolhido por alguém. Principalmente se esse alguém for você.
                Ergui a cabeça para olhá-lo e vi que não desviara o olhar da televisão.
- Ok – disse apenas e tornei a me aconchegar em seu ombro.
- Você gosta de mim? – disparou, me surpreendendo com a pergunta. Nunca passou pela minha cabeça que ele se importava com isso. Quase que simultaneamente nos olhamos, seus olhos estavam brilhando e transmitindo o que eu chamaria de... paz.
- Sim. E gosto de estar com você. – respondi primeiro porque era a verdade, segundo porque sentia que era o que ele precisava ouvir.
                Justin sorriu e eu devolvi o sorriso. Depois me deu um beijo na testa e voltou sua atenção ao filme. Fiz o mesmo, apesar de estar cansada o suficiente para não conseguir me concentrar no que acontecia na tela. Senti minhas pálpebras pesarem, de repente fiquei leve e foi como se pudesse voar, logo perdi todos os sentidos.
                Abri os olhos devagar devido à luz matinal. O primeiro som que reconheci foi da respiração de Justin, acima da minha cabeça, estávamos exatamente do mesmo jeito que dormimos. Ele dormia em um sono profundo, estava quase roncando. Dei um beijo em seu nariz, levantei-me cuidadosamente para não acordá-lo e fui direto ao banheiro. Tomei um banho demorado e vesti-me com uma camiseta bem maior que eu e um short de malha curto. Fui para cozinha e coloquei água para ferver. Quando estava lavando a louça, senti alguém segurar minha cintura e em seguida me abraçar por trás, beijando meu pescoço. Senti meu corpo todo se arrepiar e desejei que ele não notasse, apesar de ser quase impossível levando em conta que estava colado em mim. Justin soltou um risinho. Virei o pescoço e beijei sua bochecha.
- O que foi, voltamos ao jardim de infância? – disse em tom de deboche. Revirei os olhos e selei nossos lábios demoradamente. – Legal. Progredimos. Agora estamos no Ensino Fundamental. – respirei fundo e deixei um copo de lado. Virei-me de frente para ele e com as mãos cheias de sabão segurei seu pescoço, sem pestanejar beijei-o. Mas foi um beijo de verdade. Deixei transparecer o quanto queria ter feito isso antes. Às vezes não tem problema deixar o orgulho de lado. Às vezes dar um beijo com sabor de “quero ser amada” não faz mal. Justin beijava bem. Na verdade, devia ter dito isso antes. Diria que ele era melhor nisso do que qualquer outro homem que já tenha beijado, e isso que foram muitos. O segundo lugar vai para... Bryan. Mas todos querem sempre o primeiro lugar, seja relacionado a beijo ou a melhor e mais nova tecnologia. Com Justin certamente não era diferente. Todas as meninas o desejavam. Ninguém dava créditos ao segundo e terceiro lugares. Gostaria que dessem, pois Bryan merecia, assim como o futuro homem do terceiro lugar, que eu ainda não descobrira. De repente, lembrei-me da noite anterior e do olhar decepcionado que ganhara de Bryan. Parei o beijo. Situei minhas mãos e percebi que estavam na bunda de Justin, logo as recolhi. Ele umedeceu os lábios e disse:
- Ensino Médio. – deu um sorriso de canto.
- Posso saber quando seríamos adultos?
- Quando você estiver na cama, nu, me olhando com cara de safada, com uma música não necessariamente lenta tocando.
                Soltei uma risada alta. Justin ficou sério.
- O que foi? Sexo agora é só para desconhecidos? Se eu for procurar outra pra satisfazer minhas vontades você não reclama. – senti meu sangue ferver no instante que ele terminou. Agora também estava séria.
- Eu não quero brigar. E pelo amor de Deus, pense muito antes de dizer algo a mim. Você me machuca com isso e nem sabe o quanto. Meça as palavras. – apesar de nervosa, automaticamente deixei meu lado emotivo falar. Um dos meus piores defeitos. Baixei a cabeça.
- Deixa de ser dramática. Se for porque disse que vou procurar outra, é exatamente o que vou fazer se continuar com essa sua postura de idiota. – cuspiu as palavras.
- Eu não sou só sexo, Justin! – disse alterando a voz - Já basta ter que transar todos os dias para conseguir dinheiro, ser humilhada e julgada pelas pessoas que acham que faço isso por prazer. Mas eu não tenho opção! Cansei disso. E se quiser ir procurar outra, tudo bem. Eu vou entender. Não eu não sinto ciúme de você. Não sou sua dona e não é como se estivéssemos namorando. – disse tudo muito rápido, gostaria de piscar e voltar ao momento em que ele ainda dormia e eu acabara de acordar.
- Então não foi nada pra você? – disse em seu tom de voz normal - O elevador, o brigadeiro – é, eu andei treinando -, a ida à minha casa, quando eu vim aqui depois de nos encontrarmos no mercado, nossa primeira vez, ontem... O que aconteceu com aquele “sim” quando te perguntei se gostava de mim? Pois é, eu já estava sóbrio. Lembro-me de tudo depois do banho. Para de fingir que não sente nada, Megan. – terminou de dizer e tinha mágoa no olhar. Senti-me culpada, apesar de saber que não era.
- Se quiser saber a verdade, Justin, vou te dizer. Eu sinto, e eu realmente gosto de você. Mas eu me sinto assustada, pois nunca senti isso antes e ambos sabemos que eu não posso... – ele me interrompeu.
- Eu não me importo se você se prostitui. Na verdade, ontem eu fui na boate pra te encontrar e te dizer que não precisa mais fazer isso.
- E você acha que vou fazer o que? Viver do seu dinheiro? – ri sarcasticamente – Não rola.
- Não necessariamente. Nós transamos e eu te pago por isso. Prostituição pra uma pessoa só. Será que não dá pra deixar o orgulho de lado pelo menos dessa vez? Assim além de ficarmos juntos, você não é obrigada a ir àquela boate toda noite pra ganhar uma mixaria.
- Podemos conversar sobre isso depois? – disse e suspirei. Justin assentiu.
- E desculpe. Eu sei que você é mais que um corpo bonito.
                Sorri. O que mais poderia fazer? Eu acreditava nele.
- Justin – ele me olhou como se esperasse que eu continuasse. Por um momento pensei em ficar calada, talvez não tocar no assunto fosse o melhor a se fazer. Mas minha curiosidade era maior e soltei antes mesmo que percebesse: - Ontem, antes do banho, você estava muito chapado. E mencionou algo sobre uma pessoa. Disse que sentia falta dela. – pigarreei – Quem é Trisha?
                Seu rosto se iluminou. Parecia não acreditar que falara dela. Abriu a boca mas não emitiu som algum e então tornou a fechá-la. Nunca achei que o veria tão sem jeito.
- Eu... Trisha era minha namorada. Quando vim pra cá, há três anos atrás, eu a trouxe também. Mas ela nunca mais voltou. Os pais dela me culpam até hoje. Acho que faria o mesmo. É complicado. Ainda não estou preparado para falar sobre isso com você, então...
- Tudo bem, Justin. Quando você preferir – sorri e ele retribuiu. – Eu posso chamar um táxi e te deixar no seu hotel, vou precisar sair.
- Vai à casa do Bryan, acertei?
                Minha garganta travou e meus olhos devem ter se arregalado. Tudo que pude fazer foi ficar intacta. Podia jurar que até minha respiração parou. Justin riu.
- Eu não ligo. Não tem problema você ir. Ele deve estar chateado por ontem e se fosse o contrário, eu gostaria que você fosse atrás de mim. Só não pode abusar, ok? Deixe os beijos comigo.
                Ri, sentindo-me despetrificada.
                A cada passo estava mais perto da casa de Bryan e a ideia de ainda não saber exatamente o que lhe falaria estava me desesperando. Parecia que meus pés pesavam dez vezes mais que o normal. Respirei fundo e bati na porta. Depois outra vez. E mais uma. Ia levantar a mão para fazer novamente mas ela foi aberta. E o que vi na minha frente definitivamente não era o que eu esperava muito menos o que eu queria. Jenny, a garota da sorveteria, estava lá, com os cabelos negros caindo sobre os ombros e me olhando como se quisesse dizer “ótima hora para aparecer e estragar tudo”. Desejei que ela percebesse que eu não estava feliz em vê-la tanto quanto ela não estava em me ver. Bryan chegou por trás dela, segurando em sua cintura com as duas mãos, e com uma expressão de surpresa ao pousar os olhos em mim. Tentei dizer algo, mas minha voz parecia ser a única coisa não funcionando no meu corpo. E naquele momento, ela parecia ser mais importante que o bater de meu coração. Juntei todas as minhas forças.
- Posso... – engoli em seco. Não conseguia nem completar uma frase, quem dirá me desculpar com Bryan. Ele e Jenny se entreolharam e depois de um meneio de cabeça dela, saiu e assim fez com que o ar ficasse de alguma forma mais leve.
                Bryan deu dois passos e fechou a porta atrás de si. Me olhava sério como nunca fizera antes.
- Olha, eu... – me interrompeu. Apesar disso, eu sabia que conseguiria continuar. Isso me levou a uma conclusão: o motivo da minha falta de voz era Jenny. Ou talvez apenas a presença inesperada dela.
- Não, Megan. Não se desculpe. Poupe-se de fazer isso. Você teve escolha, e estava em sã consciência, então não pode ter se arrependido de verdade.
- Eu não me arrependi. A questão é que não precisa ser assim. Vai deixar de falar comigo por ter ido ajudar Justin, quando ele não tinha ninguém, e você sua irmã? Isso tão idiota, será que não percebe?
                Ele baixou a cabeça e coçou a testa.
- Deixei bem claro que era pra me esquecer se fosse com ele. Não vou voltar atrás com isso.
                Dei-me por vencida.
- Se é assim que você quer, tudo bem. Sabe onde me encontrar.
                Bryan olhou em meus olhos uma última vez, e não consegui decifrar o que eles tentavam transmitir. Mas de uma coisa tinha certeza: aquele brilho não era normal. Estavam marejados. Virei-me e apertei os passos em direção à saída do condomínio. Senti seu olhar pesar em minha costa. Talvez quisesse que eu insistisse. Que implorasse para que ele não me deixasse. E eu faria isso. Faria mesmo. E por que não fiz? É uma pergunta para a qual não tenho resposta e talvez nunca tenha.

Continua...

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

She Will Be Loved - Esquece que eu existo.

- Ei, acorde! – ouvi uma voz desconhecida e grossa gritar, mas apesar do tom alterado, o som parecia estar longe. Tentei abrir os olhos, mas ao mesmo tempo uma força que não sabia de onde vinha tentava me manter inconsciente – Mas que diabos...? Você já deveria ter voltado ao normal, só pode estar de brincadeira! Hector, tem certeza de que ela está viva?
- S-Sim! Eu apenas a dei o remédio que o senhor mesmo disse. Veja, ela continua respirando – uma voz mais suave disse e o temor estava estampado em seu tom.
- Acorda, Megan! O que há de errado?
                O imaginar que talvez não conseguiria voltar ao normal estava me desesperando. Mas então tentei abrir os olhos mais uma vez, e no começo tudo estava embaçado, mas logo as coisas foram entrando em foco. Via o teto branco e Justin me olhando sem nenhuma expressão. As duas outras coisas que reparei foram: estava sem camisa e com o cabelo bagunçado.
- Você está bem? – sua voz estava mais rouca que o de costume.
- Sim. Só tive um pesadelo.       
                Ele assentiu e saiu dali. Então reparei que estava deitada em sua cama. Respirei fundo e minha alma pareceu descarregar-se. Minha mente estava tranquila. Por incrível que pareça estava tranquila. Dei atenção ao meu coração e ele não dizia nada. Por incrível que pareça não dizia nada. Eu me sentia bem. Justin tornou a entrar no quarto segurando uma bandeja. Olhei para o que tinha ali e para ele. Não pude conter um sorriso de incredulidade. Depois de se aproximar e se sentar ao meu lado com a bandeja cheia de coisas para café da tarde entre nós, ficamos mantendo apenas nossos olhos ligados por um momento que me a meu ver, foi curto. Então Justin pigarreou, e pareceu querer me dizer algo mas não saber como.
- Eu tenho uma notícia não muito boa – sua voz vacilou.
- O que aconteceu? – perguntei afobada.
- A Rua das Esmeraldas não existe.
- E daí? – perguntei sem saber porque ao certo aquilo era ruim.
- E daí... Que é a rua que seu “pai” nos deixou como endereço. Procurei na internet e nem sinal dessa rua em Los Angeles.
                Esquecera-me completamente do bilhete.
- Ele pode ter errado, eu queria muito ir lá hoje, mas não me importo de esperar outra carta com a correção do endereço – disse convicta.
- Não acha estranho ele ter errado o nome da rua que mora a tanto tempo?
- Justin, o que você está querendo dizer com isso? Quer me desanimar ou me ajudar? – perguntei, alterando um pouco a voz sem me dar conta disso.
- Não é isso, Megan. Mas isso está muito estranho e eu não quero que você se decepcione se, por um acaso, não for o seu pai. Só quero te manter com os pés no chão. Temos que pensar em todas as possibilidades, e estou pensando numa das melhores quando digo que pode não ser ele. E se quer saber a pior delas, lá vai. Já passou pela sua cabeça que pode não ser ele e sim um bandido ou sequestrador ou sei lá o que só usando a história do seu pai pra chegar até você?
                A esse ponto meus olhos já estavam cheios de lágrimas e meu Deus, como ele podia pensar assim? Respirei fundo fazendo força para engolir o choro.
- É a letra dele, Justin. Você não entende, você tem seus pais vivos e pode chamá-los a hora que quiser. É fácil pra você. Já eu – dei uma risada abafada e sínica – Eu, Justin, eu não tenho ninguém.
- Mesmo depois de tudo que eu te disse mais cedo você continua achando que eu tenho uma vida perfeita, não é? – ele disse parecendo chateado – Mas eu não sei mais o que posso fazer pra te mostrar que não é nada disso, então continue pensando assim e espero que um dia você perceba a realidade. E sério, não tem problema se acha que eu não sou ninguém.
                Ele levantou-se abruptamente derrubando dois copos de suco de laranja da bandeja e molhando um pouco os lençóis. Me senti mal. Na verdade eu tinha consciência de que a vida dele não era as mil maravilhas que eu pensava no começo, mas ele me irritou falando sobre meu pai e acabei falando sem pensar. Coloquei a bandeja de lado e me livrei dos lençóis molhados. Sai pelo apartamento à procura de Justin e encontrei-o na cozinha. Estava de costas para mim, com as mãos apoiadas na pia e a cabeça baixa. Aproximei-me e toquei sua mão. Sua pele estava gélida. Ele não se moveu.
- Justin... – disse com a voz mais mansa que poderia fazer.
                Ele olhou para mim e seu maxilar estava travado. Seu rosto expressava ódio e confesso que dava um pouco de medo, mas ficava sexy. Justin não era do tipo não agressivo, ou calmo, se preferir.
- Eu sei que sua vida também não é fácil. Eu não quis dizer aquilo. Só estava irritada. Não quero brigar com você, vamos esquecer isso, tudo bem?
                Justin não disse nada. Sabia o que queria fazer. Então me inclinei um pouco e o abracei. Ele retribuiu depois de alguns segundos. Parecia que tudo girava ao nosso redor. Era como se a Terra tivesse parado de dar atenção à órbita do Sol e começasse a fazer seu movimento em torno do nosso abraço. Minha pele contra a dele. Seu cheiro invadindo meu nariz. Suas mãos frias tocando meus ombros. Justin afrouxou o abraço e desvencilhei-me dele. Agora seu rosto não demonstrava nenhuma expressão.
- Tenho que te levar pra casa. Vou resolver algumas coisas no banco.
                Assenti e depois de me deixar em casa, Justin saiu cantando pneu, o que fez alguns vizinhos abrirem as janelas para espiar a rua. Passei o resto da tarde tentando não pensar na carta, o que de certa forma era pensar nela. Mas tive sucesso. Em compensação, fiquei imaginando onde Justin estaria agora. Na verdade não acreditava que ele iria “resolver algumas coisas no banco”. Devia ter se cansado de mim e ido procurar outra menina pra se divertir. Esse pensamento fazia meu estômago revirar. Então tentei também não pensar nisso. Sem sucesso. Teria que ocupar minha cabeça com alguma coisa mas não tinha ideia do que seria. Subitamente me ocorreu, como se eu tivesse me esquecido, que já era 19 horas e eu ainda não saíra da vida de prostituta. Procurei a vontade de me arrumar enquanto o pensamento de que teria de enfrentar transar com um ou mais desconhecidos outra noite me atormentava. Logo, me senti desanimada e com uma preguiça que nunca tivera antes de sair de casa. Apesar disso, tomei banho e me arrumei rapidamente e sai pelas ruas em direção à boate, reparando em todas as pessoas que passavam por mim. Com minha roupa não dava para perceber o que eu estava indo fazer, então não era o centro das atenções como acontecia muitas vezes.
                A música era Hangover – Taio Cruz. A fumaça se fazia pouco presente. A boate estava lotada como nunca. Muitas pessoas já estavam bêbadas e podia contar nos dedos quantas estavam paradas. Além do cara do bar, três mulheres e dois homens. Foi a primeira vez desde que comecei a frequentar aquele lugar que decidi não ser só mais uma prostituta, mas me divertir. Me divertir de verdade em uma balada sem pensar nas contas e na comida que logo faltaria na minha geladeira. Me divertir como nunca havia feito antes.
                Depois de dançar cerca de quinze músicas e já estar com a visão um pouco embaçada devido a quatro copos de vodka, senti um puxão no meu braço e fui arrastada para fora do aglomerado de pessoas que estavam amontoadas enquanto dançavam. Olhei para trás e vi um dos homens que antes estavam parados. Ele tinha um pouco de barba e aparentava ter 30 anos. Estava vestido formal demais para uma boate e só agora reparara nisso.
- Desculpe, em que posso ajuda-lo? – perguntei cautelosa, ele me observava como se estivesse me avaliando.
- Ah... Claro, claro – sorriu – Me chamo Mark. E você é...?
- Megan. Megan Martinez. – disse apertando sua mão em forma de cumprimento.
- Eu sou de uma agência de modelos. Você... hum...está atendendo a algum contrato no momento?
- Como modelo? – perguntei estranhando – Ah não, na verdade eu...
- Você não é modelo? – Mark sorriu. – Sinceramente não sei como ainda não te descobriram aqui. Nunca nem tentou trabalhar nesse ramo?
- Nunca ninguém me disse antes que eu tinha beleza suficiente para isso então...
- É um desperdício. – disse me interrompendo pela segunda vez - Está trabalhando em que agora?
- Estou em... Um projeto pessoal, isso me toma um pouco de tempo – menti, apenas porque não queria ter o desgosto de dizer que era prostituta naquela boate.
- Bom... Fica com você o meu cartão e quando estiver livre, pense na minha proposta. Tenho certeza de que nasceu para as passarelas. A propósito, você é linda. Vou esperar pela sua ligação.
                E então depois de me entregar um cartão que tirou do bolso, saiu acompanhado pelo outro homem vestido tão formal quanto ele. Apertei o cartão entre os dedos e o guardei em minha pequena bolsa de mão. Queria passar horas e horas pensando no que havia acontecido, mas não tinha tempo para parar de me divertir. Quando ia voltar à pista de dança, minha atenção, assim como a de muitas pessoas ainda sóbrias ali, foi chamada por uma roda que se formava ao redor de duas pessoas das quais emitiam muitos gritos. Fui me aproximando e me espremendo entre muita gente. De alguma forma, parecia conhecer aquelas vozes. Levava cotoveladas e empurrões. Não me importava. Até que cheguei ao centro da roda e não quis acreditar no que via. Bryan, sóbrio, com a camiseta azul marinho rasgada e os olhos exalando fúria, partia para cima de Justin, completamente bêbado, que aparentava não saber o motivo por estar metido em uma briga e com o nariz sangrando. Sabia que se Justin estivesse são não estaria naquela situação, Bryan é que estaria muito pior. Vi um pouco além e Emily segurava forte o braço de seu irmão com a ajuda de Chaz, porém os dois não eram suficientes para segurá-lo. Justin foi nocauteado com um soco na bochecha esquerda e caiu sentado enquanto xingava. Não poderia ficar parada, não poderia ver Bryan machucando-o mais. Quando ele ameaçou dar outro soco em Justin eu entrei no meio e acabei sendo acertada por sua mão, Bryan me viu e se encolheu devagar, agora com o olhar curioso e surpreso.
- Desculpe, mas você tem a Emily e o Justin não tem ninguém.
                Virei-me para trás e ajudei Justin a se levantar. Logo quando o fez, o fedor de álcool da sua boca era inconfundível. Ele riu estranho. Ia começar a andar com ele quando Bryan me deteu.
- Megan, se você for com ele, esquece que eu existo – seu tom era sério.

                Olhei para Justin e depois voltei meu olhar para ele, tentando dizer “desculpe” sem emitir nenhum som. Bryan sacudiu a cabeça em um sinal de confirmação e sua expressão passou de séria para decepcionada. Me sentira mal, mas sabia que Justin precisava de mim mais do que ele naquele momento. Passei um braço dele pelo meu pescoço e segurei em sua cintura, andando devagar e com dificuldade, pois suas pernas estavam cambaleando. Fora da boate, ajudei-o a deitar-se no banco traseiro de um táxi e fui sentada com sua cabeça em meu colo. Imaginei que aquela posição estava desconfortável para ele mas logo chegaríamos em casa. Passava os dedos pelos seus fios macios de cabelo enquanto Justin cantava uma música que nunca ouvira antes, me olhava nos olhos e sorria. Eu ri e acariciei sua bochecha esquerda. Estava roxa. O sangre no nariz estava seco. Ele era lindo. O nariz tinha uma forma espetacular, e cada centímetro de seu rosto parecia ter sido feito pelo melhor arquiteto existente, atingindo a perfeição. Naquele momento eu tive uma certeza: eu gostava dele. Gostava do jeito dele e da companhia dele, mesmo bêbado. Lembrei-me de Bryan e do seu olhar decepcionado e pedi mentalmente que ele me perdoasse por isso. Perguntava-me se fizera a escolha certa.
Continua...

http://31.media.tumblr.com/4559da8d4b4438225a85084ae807c206/tumblr_mpomzhyN9a1s6lizao1_500.gif 
Megan: http://25.media.tumblr.com/ea5017cbbdebbae465be78e414c07d6f/tumblr_msa8a6wfF61sfn28fo1_500.gif
Justin: http://31.media.tumblr.com/7420df8a38b13ce4ae9a3c7e1087b58d/tumblr_msilmlI5yK1sbkcgho1_500.gif http://24.media.tumblr.com/60142c5a1b899b8608d462394ec571eb/tumblr_msf2q0KCYo1rg1awxo2_500.gif